sábado, 23 de agosto de 2014

Caminho de Santiago : verdades, mitos e lendas!






Caros amigos,
Segue a experiência há pouco vivenciada e compartilhada de dois amigos 
: Marcelo Uchôa e Angela Uchõa, que nos brindam com suas experiências , pois fizeram seu caminho!
CAMINHO DE SANTIAGO
VerdadesMitos e Lendas

Entre verdades, mitos e lendas medievais nasce a história de São Tiago, um dos 12 apóstolos de Cristo, que por ser possuidor de forte personalidade, ficou conhecido por “Boanerges”, que quer dizer filho do trovão. Tiago, filho de Zebedeu e Salomé, irmão mais velho de João Evangelista, descendia de uma família de pescadores do Lago Genezaré, na Galiléia, Palestina. Depois da crucificação e morte de Jesus, Tiago foi enviado às terras distantes da Galícia, atual Espanha, com a finalidade de evangelizar esses povos, aí permanecendo durante seis anos.
Cumprida a sua missão voltou à Palestinano momento em que membros da Igreja eram perseguidos pelo rei Herodes Agripa I, por ordem de quem, Tiago foi preso e decapitado no ano 42 DC,tornando-se o primeiro apóstolo mártir do cristianismo.
Jogados para fora da muralha de Jerusalém, seus restos mortais foram recolhidos por dois de seus discípulos, Anastácio e Teodoro, que, segundo a lenda, os colocaram num barco de pedra, o qual, guiado por anjos, saiu à deriva e foi aportar em Iria Flávia, distrito de Padrón, na costa oeste da Espanha, onde um lindo bosque chamado Libreton, guardou silenciosamente seus ossos durante oito longos séculos.
No século IX, Pelágio, um eremita da região, avistou no céu uma chuva de estrelas que apontavam para um determinado ponto no bosque, e, como o fenômeno se repetiu várias noites, a noticia acabou por se espalhar e chegar ao conhecimento do então bispo de Iria Flávia, Dom Teodoro, que autorizou a realização descavações na área indicada pelo eremita, encontrando a urna funerária de mármore no exato local para onde apontavam as “luzes místicas”. Ao lado, duas urnas menores, pertencentes justamente aos discípulos Teodoro e Anastácio.
A partir de então, o bosque de Libretón passou a ser conhecido como COMPOSTELA, que significa “campo de estrelas”, fazendo com que El Rey, DomAlphonso II, conhecido como “o casto”, ordenasse que sobre a tumba do apóstolo fosse erigida uma igreja, a mesma que após sucessivas reformas resultou na atual e majestosa Catedral de Santiago de Compostela.
Até os dias atuais, as santas relíquias do apóstolo continuam guardadas numa urna de prata no interior da catedral, para onde convergem,há mais de 12 séculos milhares e milhares de peregrinos cristãos e não cristãos de todas as partes do mundo. No sagrado chão do Caminho já pisaram, além de pessoas do povo, reis, rainhas, nobres, cavaleiros templários, cruzados, religiosos, intelectuais, e muitos santos, entre eles São Francisco de Assis, Santo Domingos de Gusmão, Santa Izabel de Portugal e outros. E como testemunhas de suas pegadas, fixaram heranças medievais como castelos, igrejas, catedrais góticashospitais, escolas, mosteiros, vilas, cidades, pontes, viadutos, e um inestimável patrimônio imaterial que faz do Caminho de Santiago um dos ícones mais importantes da história da humanidade.
Existem várias rotas que levam a Santiago de Compostela: o chamado caminho primitivo, o chamado caminho francês, o caminho aragonês, o caminho português, o caminho da prata, o caminho do norte, etcque, saindo de diferentes pontos do solo europeu, desembocam na bela cidade espanhola de Santiago de Compostela, mais precisamente na belíssima Praça do Obradoiroa qual, situada à frente da majestosa catedral, é o ponto final da longa, difícil e ao mesmo tempo prazerosa caminhada de quantos saem de seus lares em busca de conhecer esse importante ícone religioso e turístico da humanidade.
O caminho francês é, entre todos, o mais estruturado e concorridotendo sido proclamado em 1995, pela UNESCO, como patrimônio da humanidade. Foi descrito pela primeira vez pelo Cânone francês Aymeric Picaud, em 1122, no Codex Calixtinus (primeiro guia escrito do Caminho). Tem início na cidade de Sant Jean Pied de Port, na parte francesa do País Basco, entra na Espanha pela cidade de Roncesvalles e segue por longos 800 quilômetros através das províncias de  Navarra, La RiojaCastilla y León, até a cidade de Santiago de Compostela, na Galícia, rota que se pode percorrera pé, a cavalo ou de bicicleta.
SETAS AMARELAS distribuídas em todo o trajeto,conduzem o peregrino com segurança até o seu destino final. Assim como a vieira (concha marinha), outro símbolo do Caminho, elas podem ser vistas incrustadas em pedras, no chão das cidades, nos muros e fachadas de casas, no caule de árvores, empostes de iluminação públicaauxiliando o peregrino para que não se desvie da rota quleva ao objetivo final da caminhada.
CREDENCIAL – Trata-se de um documento semelhante a um passaporte, que o peregrino necessita portar para ser carimbado ao longo do trajeto. Este documento o credencia a receber, ao final de sua caminhada, uma espécie de diploma chamado de COMPOSTELANAEsse “passaporte” será carimbado quando da passagem do caminhante por igrejas, albergues, restaurantes, bares, e outros espaços públicos ou privados, atestando que efetivamente realizou a caminhada.
Os Símbolos do Caminho
Diversos ícones materiais e imateriais perfazem o Caminho de Santiago, compondo seus símbolos principais; O CAJADO, tem importância fundamental como apoio indispensável ao equilíbrio da caminhada, especialmente nas áreas mais íngremes, nas subidas e descidas fortes, nas áreas de pântano, nas áreas de neve, ou mesmo como instrumento de proteção contra as eventuais investidas de animais silvestres ou domésticos; A CONCHA ou VIEIRA, que entre outros significado representa a lendária viagem do corpo de São Tiago, da Palestina à Galícia. Conta-se que durante esse traslado, caiu uma tempestade forte e o corpo do apóstolo desapareceu no mar, sendo encontrado muito tempo depois, já coberto de vieiras. Em geral uma réplica dessa concha é levada pelos caminhantes no pescoço, pregada na mochila ou na própria roupa; A CABAÇA, onde os peregrinos da época medieval carregavam a água que lhes matava a sede e permitia cozinhar os alimentos; A CRUZ, um crucifixo com formas semelhantes às usadas pelos antigos cavaleiros templários, com os braços rematados em forma de flor de lis e a ponta de baixo no formato de uma espada, e que os caminhantes usam no peito ou pescoço durante sua peregrinação.
O que faz uma pessoa deixar a família e amigos, para percorrer 800 quilômetros à pé, numa rota medieval?
Os interesses podem ser os mais diversos: religioso, espiritual (é considerado místico pelos exotéricos), aventureiro, esportivo, cultural ou até turístico. Turístico, sim, pois o caminho é de uma beleza extraordinária: entremeado por montanhas, bosques, rios, quedas d’água, construções medievais, ainda guarda heranças dos antigos povos celtas que viveram na região bem antes de São Tiago. Não por acaso foi proclamado Patrimônio Cultural da Humanidade, em 1995, pela UNESCO.
Meus Sentimentos
Cinco vezes tive o privilégio de por meus pés e esperanças nesse chão sagrado. Confesso que quando decidi enfrentar o desafio de trilhá-lo pela primeira vez, não era capaz de identificar exatamente que força me impulsionava, apenas uma certeza: queria paz, conversar com o silêncio. Na verdade, uma BUSCA pois nada acontece por acaso. Sem aprofundar os questionamentos, tracei uma meta e saí em direção ao meu destino. Hoje, cinco compostelanas (ou compostelasdepois, tenho a nítida clareza de que seguir uma rota de peregrinação é empreender um caminho não só exterior, mas essencialmente interior.
Os maravilhosos bosques, o silêncio, só interrompido pelo canto dos passarinhos (quantas vezes ouvi o cuco), o borbulhar das águas, as exaustivas subidas e descidas de ladeiras nas montanhas, o peso da mochila, as dores no corpo, as bolhas nos pés, o medo do fracasso......enfim, uma marcha árdua mas ao mesmo tempo bela e  emocionante e que nos transmite mensagens em meio às mais diversas provações, só poderia mesmo resultar num processo de auto conhecimento.
Tudo parece ter uma correlação com a nossa vida
Ao iniciarmos o caminho temos uma meta: chegar a Santiago de Compostela e ao túmulo do apóstolo, que no entanto é realizada por etapadiárias de 20 a 25 quilômetros. E seguimos passo a passo, cadaqual no seu ritmo, economizando esforço nas subidas, diminuindo os impactos nas descidas, com a indispensável ajuda do cajado, nunca perdendo de vista as setas amarelas – um verdadeiro exercício de determinação, perseverança e respeito.
A acolhida nos albergues do Caminhoem especial a de Jesus Jato, num dos mais espiritualizados, AveFenix, aliada à ajuda desinteressada dos companheiros de caminhada, nos dá a certeza de que a solidariedade e a generosidade existem, sim.O desapego é outra constante em nossa jornada. A toda hora deixamos para trás o que nos é supérfluo, o que nos causa desconforto, as próprias amizades do caminho, e principalmente as “pedras” da nossa vida.
E no final do dia, quando o corpo já beira à exaustão, basta vislumbrar um “pueblo”, ainda que a quilômetros de distância, para que as forças renasçam: é a esperança, o forte sentimento que nos motiva a viver.
A chegada à Catedral de Santiago é um momento glorioso: é a meta cumprida, a realização do sonho, a constatação de que podemos superar as adversidades da vida. Porém, quero concordar com Guy Veloso, quando afirma que mais importante do que a chegada é o próprio caminho, pois é exatamente nele onde está a verdadeira essência da peregrinação.  
Recentemente (maio/2014) tive o privilégio de compartilhar momentos e experiências profundas com meu filho Marcelo. Foi por ele e para ele que decidir percorrer as trilhas sagradas do caminho da “via láctea”.
Muitas vezes optamos por caminhar solitariamente, ainda que juntos, talvez movidos por um desejo inconsciente de recolhimento imposto pela própria peregrinação. Era o momento ideal para pensar na nossa própria vida, nas pessoas queridas e fazer as orações a nós confiadas. Aqui e ali, uma paradinha nas “tabernas”, mais um carimbo na credencial, o  encontro com outros peregrinos, num alegre e salutar intercâmbio de experiências, culturas e línguas. E quando cansados, a acolhida dos silenciosos bosques, umas tacinhas de vinho, afinal de conta “con pan y vino se hace el camiño”.
Finalmente, ao cair de uma linda tarde, com um corpo cansado e uma alma radiante alcançamos a majestosa catedral de Santiago de Compostela, o nosso ideal maior. Marcelo caiu de joelho sobre a vieira de pedra ao centro da Praça do Obradoiro, e por algum tempo deixou que as lágrimas lhe lavassem a face e a alma! Choramos juntos.
Cumpridos os rituais da chegada, a emocionante missa do peregrino, a alegria transbordante de abraçar o apóstolo, e como nunca sentir o ressurgimento da fé.
Concluída a peregrinação, a saudade das roupas peregrinas, o adeus à Terra Santa de São Tiago de Compostelae a certeza de que as setas amarelas continuariam sendo as estrelas guias do nosso caminho real, que se iniciava a partir daquele instante.
Por todas essas circunstâncias posso afirmar, ao meu sentir, que o Caminho de Santiago é a verdadeira metáfora de nossa própria vida.
BUEN CAMIÑO!
Angela Ribeiro Uchôa      
Agosto de 2.014



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